A chuva caía pesada enchendo os rios,
Alagando a mata,
Trazendo o peixe para mais perto.
O igapó ficou barulhento
Como barulho da matrinxã.
A barriga roncou alto
Que fez Chico encher a boca de farinha
Para aguentar mais um bocado.
Tarrafeou e mariscou
Até ficar de tarde.
Voltou remando
Deslizando nas águas
Encardidas do Purus,
Trazendo seus peixinhos.
Enquanto remava, mascava a farinha,
Pensava na vida, pensava na morte.
Aí seu coração
Foi se enchendo de raiva, de muita raiva
A ravia lhe deu força
E foi furando as águas,
Rasgando o rio,
Empurrando a correnteza...
Mas seus braços logos se cansaram
Sua raiva foi virando tristeza
Se acabou em lágrimas.
"É o destino" pensou consigo mesmo.
Engoliu seco, enxugou o rosto
Com as costas da mão.
Voltou pra casa
Do mesmo jeito de sempre.
Bem de noitinha, comeu o peixe,
Bebeu o caldo, espantou as carapanãs.
Deitou na rede e dormiu.
Dormiu triste, suspirando
De quando em quando
Lembrando que de manhã ia sair
Ainda no escuro, cortar a seringa,
Colher o leite pra fazer a borracha.
E, no sábado, trocá-la no batelão do patrão,
Por um litro de cachaça.
E beber ela todinha pra esquecer da vida,
pra esquecer que é o destino
Pra sonhar que há esperança.
Sandra Giani...
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